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sábado, 27 de julho de 2013

Resumo do artigo: Memória e humor gráfico: caricaturas e releituras de Belmonte.


Resumo do artigo: Memória e humor gráfico: caricaturas e releituras de Belmonte, de Marilda Lopes Pinheiro Queluz, no livro Design e Cultura.

O texto é parte de um trabalho amplo que visa compreender a releitura como uma estratégia artística na reconstrução do sentido.  Como recorte, são usadas caricaturas de Benedito Bastos Barreto (Belmonte). A análise proposta parte das teorias de Mikhail Bakhtin buscando novas relações de tempo e espaço (cronotopo) por meio das construções de intertextualidade. 

A definição de caricatura adotada é uma concepção de Rivers (1991) onde não é considerada como uma entidade pré-existente, emoldurada por um contexto, mas situada numa dimensão que interage com o processo histórico que se constitui. Assim sua concepção é dinâmica, ao mesmo tempo em que é influenciada pelo contexto, acaba influenciando-o.

Dentro do contexto de enunciação-enunciador-enunciatário, a autora propõe que a caricatura é uma inversão da inversão, o avesso do avesso, onde o passado e o presente se encontram na afirmação e na negação da história num só tempo. Torna-se um jogo, onde a ironia apresenta um desencontro entre o enunciado e enunciação. Dentro deste discurso seu conteúdo contém o seu contrário.

Segundo a autora, a dessacralização é um dos elementos característicos da caricatura, assim como a ironia e a ambiguidade. Existe uma “capacidade” de deslocar constantemente o ponto de vista, transformando-o em múltiplas perspectivas interpretativas.

Outro ponto comentado, e importante sobre o entendimento da caricatura como uma linguagem urbana, buscando a perspectiva do leitor, deixando-o entrever os projetos fracassados, as contradições do sistema, os sonhos, desejos e frustrações de quem não está no centro das decisões. A cidade é construída a partir do “fazer ver” e “fazer ser visto”, em “jogos de visibilidade” dos atores sociais em suas diferentes funções.

São apresentadas três caricaturas de Belmonte da década de 1940 e suas releituras por três artistas diferentes no ano de 1996.  Em síntese as análises contêm em comum a características de deslocar o sentido, é estabelecida uma dinâmica interativa, um diálogo sobre o presente, uma intersemiose entre sistemas de signos diferentes. Atua-se no limite entre uma obra e outra, num processo de contaminação, o que ocasiona sempre uma nova reação, uma nova assimilação, uma nova conexão entre história e linguagem.  Cria-se uma paródia da paródia, num movimento constante de autocrítica, de produção de sentido.

Segundo a autora:
No jogo entre o presente e o passado, constitui-se uma trama de relações entre os tempos da história, a partir do olhar crítico, da ironia, da ambiguidade, da inversão. Reafirmam-se os modos de presença do outro, multiplicam-se os pontos de vista. As teias de intertextualidade mostram a história brasileira como um todo marcado pelas descontinuidades, uma constância entre camadas de nuances diversas. O olhar não se fixa nem na obra nem na releitura transita, percebendo as relações de sentido serem construídas nas fronteiras.

Para maiores detalhes, recomendo a leitura do artigo completo:
QUELUZ, Marilda, P. L.. 
Memória e humor gráfico: caricaturas e releituras de Belmonte. In: Marilda Lopes Pinheiro Queluz. (Org.). Design & Cultura. 1ed.Curitiba: Sol, 2005, v. , p. 111-131.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Resumo do artigo: Existe Design Brasileiro? Considerações sobre o conceito de identidade nacional.

Resumo do artigo: Existe Design Brasileiro? Considerações Sobre o Conceito de identidade Nacional, de Marinês Ribeiro dos Santos, no livro Design e Identidade.

Inicialmente a autora relata com a questão de uma identidade nacional brasileira no design é um tópico discutido há muito tempo dentro da profissão. E inicia suas considerações sobre um “design brasileiro” tendo como referência uma entrevista do designer Alexandre Wollner, onde declara a inexistência de um “design brasileiro”.

No entendimento da autora, a concepção de identidade de Wollner baseia-se na existência de uma identidade única, e intimamente ligada, à formação do povo brasileiro e que estaria se diluindo com os processos de globalização.

Com esta informação, SANTOS promove um desmonte da ideia de identidade pura e autêntica. Com base nos estudos de Stuart Hall, é chamada a atenção como a dimensão cultural está presente em qualquer prática social, e que toda prática depende e tem relação com um significado. Este significado não é intrínseco às coisas, mas é atribuído por fatores simbólicos e culturais, os quais são construídos por meio da linguagem e das representações. 

O conceito de identidade inicial de Wollner é deslocado para dentro da discussão acerca de linguagem e da representação, e assume a concepção de uma identidade construída discursivamente por intermédio das representações, deixando de ser “puras” e autênticas, mas encaradas como uma construção, uma negociação.

Em seu entendimento, a autora atribui a origem da identidade na diferença, portanto, a diferença poderá dar origem a variadas identidades que competem entre si. Assim, existem diferentes representações possíveis (identidades) e que podem ou não ser identificada com algum grupo de pessoas.

Da relação entre a subjetividade (interno – experiências vividas, compreensão de nós mesmos) e dos discursos culturais (externo – contexto cultural que dá significado as experiências) se dá a negociação para a possibilidade de uma “identidade”.

Dentro deste processo discursivo da negociação da identidade, existe um aspecto subjetivo que sugere a compreensão que temos de nós próprios (pensamento, emoções, consciência e inconsciência) inserido em um contexto social, no qual a linguagem e a cultura atribuem significados as experiências vividas.  Nesta perspectiva as identidades são perpassadas pelas representações dentro de um contexto cultural.

Para maiores detalhes, recomendo a leitura do artigo:
SANTOS, Marinês Ribeiro. Existe design brasileiro? Considerações sobre o conceito de identidade nacional. In: Marilda Lopes Pinheiro Queluz. (Org.). Design & Identidade. 1ed.Curitiba: Peregrina, 2008, v. , p. 35-49.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Entrevista com Oscar Schrappe Sobrinho - Impressora Paranaense.

Transcrição por: Raquel Maria de Oliveira em 09/01/2007. Digitalizado por Alan Witikoski.
Material disponível no acervo da Casa da Memória, Fundação Cultural de Curitiba. 
Provável autoria da entrevista: Rosirene Gemael.

Foi difícil encontrar o dia certo para que o Oscar Schrappe, presidente da Impressora Paranaense pudesse dar o seu depoimento a Casa Romário Martins. Fomos ao estabelecimento várias vezes, telefonamos outras tantas, mas “compromissos” acabavam comprometendo datas e mais datas.
Afinal do dia 20 de setembro fomos recebidos pelo senhor Oscar Schrappe sentiu-se bastante à vontade diante do microfone, não economizou tempo, à ponto de precisarmos concluir a gravação em uma segunda etapa, no dia 25 de setembro. Por problema técnico, parte do irremediavelmente comprometido e tivemos que solicitar a compreensão do entrevistado para repetir toda a conversa do nosso segundo encontro.
Ele aceitou. E contou a história da família, iniciando-se no campo gráfico em Papanduva com a confecção dos baralhos, falou dos problemas da guerra e na influencia do Contestado nos negócios da Impressora, lembrou de uma greve dos trabalhadores, pressionando a direção do estabelecimento para readmitir um litógrafo, e fez referências às poucas mulheres litógrafas em Curitiba.

1. Em primeiro lugar queríamos seu nome completo, filiação, data e local de nascimento.
Meu nome é Oscar Schrappe Sobrinho. Nasci em Joinville, Santa Catarina, meus pais eram Max Schrappe e Olga Schrappe.

2. Eles nasceram onde?
Nasceram na Alemanha, mas estiveram presentes no Brasil desde o ano de 1891.

3. E a respeito de sua infância, foi passada aqui em Curitiba mesmo?
Cheguei a Curitiba com 5 anos de idade acompanhado toda minha família. Passei minha infância e juventude totalmente aqui.

4. Quanto e em que função o senhor começou a trabalhar na Impressora Paranaense?
Comecei na função de um simples ajudante de escritório em 1912. Meus encargos eram, então, de manhã varrer o assoalho do escritório, fazer limpeza dos móveis, tirar o pó. O restante do tempo cuidava da correspondência, fazia entregas, enfim, o serviço de um boy de escritório.

5. Poderia nos contar, em rápidas palavras, a história da Impressora Paranaense?
Na verdade, querendo ir às origens sob o ponto de vista gráfico, a Impressora Paranaense foi fundada em janeiro de 1854 quando da vinda a Curitiba de Zacarias de Góes e Vasconcelos que trouxe, em sua companhia, o célebre jornalista Cândido Lopes, estabelecido em Niterói, cidade onde tinha uma pequena tipografia. Chegando aqui ele abriu outro estabelecimento para editar o primeiro jornal do Estado, o Dezenove de Dezembro. Esta tipografia teve vida própria com a família do Cândido Lopes até o ano de 1883, quando entrou na então chamada Tipografia Paranaense o Barão do Cerro Azul com a instalação de uma pequena litografia. Desde esta época o estabelecimento vem sendo denominado Impressora Paranaense.
Somente em 1894, com o falecimento do Barão do Cerro Azul, o estabelecimento passou a propriedade da viúva que tinha, certamente, auxiliares valiosos, inclusive entre os parentes de Cândido Lopes que continuavam na firma, além de outras pessoas de famílias ilustres, como o velho David Carneiro e outros.


6. E o Francisco Folch?
Francisco Folch era um litógrafo muito bom da Impressora Paranaense. Mas havia ainda outras famílias ligadas ao estabelecimento, cujos nomes constam da ata da primeira assembleia da sociedade, documento que eu conservo ainda hoje. Todavia, no começo deste século, Francisco Folch assumiu da viúva os bens da Impressora e continuou a trabalhar na direção do estabelecimento até o ano de 1912 quando meu pai ingressou na empresa. Aí, em especial me parece citar que a firma de Francisco Folch estava se ressentindo, de alguma maneira, da concorrência da litografia do meu pai, localizado em Joinville e que tinha uma filial desde 1910 no antigo Recreio Cruzeiro aqui em Curitiba. Parece que daí surgiu um contato pessoal entre Folch e meu pai que resolveram fazer a fusão com a denominação Impressora Paranaense, sob a razão social Folch & Schrappe e Cia.

7. Esta teria sido a primeiro litografia do estado do Paraná?
Eu acredito que sim, mas não tenho certeza. Sei que havia uma litografia com a denominação Hoffmann mas não conheço detalhes a seu respeito. Contudo não acredito que tivesse sido criada antes da Impressora Paranaense. Bem, mas a Impressora sob a firma Folch & Schrappe e Cia trabalhou com alguma dificuldade porque faltava o capital de giro necessário devido a concorrência. É que dois funcionários da Impressora, no ano de 1912, exatamente quando meu pai assumiu, desligaram-se da firma para abrir um estabelecimento próprio. Um era litógrafo e chamava-se Schroeder e outro era um transportador e chamava-se Rômulo César Alves. Eles abriram então uma litografia, se não me engano na rua São Francisco estabelecendo uma concorrência que muitas vezes chegava à nível bastante árduo, bastante pesado. No ano de 1917 ocorreu o falecimento do Senhor Francisco Folch e em junho de 1922 o meu pai comprou a parte do então sócio do estabelecimento e ficou sozinho sob a firma individual Max Schrappe, Impressora Paranaense, já com a presença de seus três filhos: Werner, o mais velho, Max Schrappe Junior e eu Oscar Schrappe Sobrinho. Começamos anteriormente todos como aprendizes, meus irmãos em funções técnicas, para aperfeiçoarem convenientemente em 1925-1926 foram à Alemanha, frequentar a Academia de Artes Gráficas do ...?
Eu permanecia nos escritórios e com a orientação do meu pai fui me introduzindo na direção. Mas me parece que não interessa muito a situação de cada individuo. O fato é que em 1940 a Impressora Paranaense já tinha alcançado uma posição bastante relevante no mercado brasileiro porque ela vinha trabalhando para o parque industrial tanto do Paraná como de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro; e mais tarde para o Norte e Nordeste do país. Em 1940 a firma foi transformada em Sociedade Anônima, eu assumi a presidência, meus irmãos a diretoria e demos a nosso pai o cargo de Presidente Honorário. Do ano de 1940 para cá parece que não já fatos especiais a serem relatados. A história em poucas palavras deste período pode ser resumir no fato de a Impressora ter se alargado com filiais próprias em Blumenau e outra fábrica em São Paulo, continuando a trabalhar par ao mercado brasileiro.


8. Sendo nosso trabalho voltado especialmente para a fase litográfica da indústria gráfica, gostaríamos que nos contasse, em detalhes, como se processava a impressão litográfica desde o preparo do croqui, desenho na pedra, o transporte até a impressão propriamente dita.
O trabalho naquela época inicial era o característico da litografia que partia do principio da pedra que tinha uma determinada porosidade. Pedra calcárea, era a base do processo. Estas pedras eram importadas principalmente da Alemanha. Estava-se descobrindo algumas jazidas no Brasil mas não chegaram a ser exploradas. Fundamentalmente o processo se iniciava com o trabalho do desenhista que elaborava o croqui de um rótulo, embalagem ou propaganda. Depois de aprovado pelo cliente era, normalmente, transferido para a pedra, praticamente apenas um sombreado. Ali, então, o litógrafo com sua arte completava as letras e desenhos com uma tinta especial, preta, gordurosa e preparada com ácidos e outros produtos para que ocorresse o processo químico de não aceitar tinta aqueles lugares que não tinham nada a ser impresso e como a tinta em si repelia a água, estes brancos, permaneciam molhados. A água repelia a tinta e esta por ser gordurosa, repelia a água. Por isto é que a pedra precisava ser molhada a cada impressão. Eram feitas cópias do desenho, para cada cor, que era impressa separadamente em pedra própria. Com as pedras originais eram tiradas as provas em papel especial chamado papel de transporte que era importado da França, como tudo o mais era importado, naquele período. Com este papel, tiravam-se tantas provas quantas necessárias e fazia-se a montagem em uma folha grande de papel especial muito firme para não trabalhar e lá por sua vez, era transportado para a pedra grande de impressão. Se a impressão era em branco e preto, utiliza-se apenas uma pedra. Mas, se utilizava um mesmo trabalho as 4 cores, a primeira pedra era para a impressão em preto, a segunda para o azul, a terceira para o amarelo e a quarta para o vermelho. Nesta época utilizávamos as chamadas máquinas litográficas que não existem mais, a não ser em casos muito excepcionais.

9. Quais eram as maiores dificuldades apresentadas inicialmente pelo processo litográfico?
Uma das maiores dificuldades no Brasil, sem dúvida alguma, era a mão de obra especializada no setor, que não existia. Não havia mais escolas, tampouco suficientes cursos para poder formar técnicos. Então, a Impressora Paranaense, durante muitas décadas contratou técnicos estrangeiros, principalmente da Alemanha, Suíça, Áustria e Itália. Eles vinham sob contrato e quando terminava ou voltavam para seu local de origem ou empregavam-se em outros estabelecimentos do ramo, ou ainda, permaneciam na nossa empresa como funcionários.

10. Parece que toda a matéria prima utilizada na litografia era importada. Havia dificuldade específica neste fato?
A importação naquela época se processava com todas as facilidades. Não havia a complexidade que existe hoje. Poucos papéis eram exigidos e por isto compras da Inglaterra, Estados unidos ou França era como se hoje compre de São Paulo. Uma simplicidade muito grande.

11. Algumas pessoas colocam que a Impressora Paranaense sempre este à frente dos demais estabelecimentos no ramo em termos de maquinário, como o senhor caracteriza e justifica esta vanguarda?
Esta vanguarda existiu durante longos anos, mas também houve períodos em que a diferença com os demais estabelecimentos eram mínimas. Contudo, ela deveu-se ao fato de que sempre dispúnhamos de técnicos muito capazes, que costumavam acompanhar toda a literatura especializada alemã, com muito conhecimento de causa. Tínhamos assim, a ideia de como estava ocorrendo o avança técnico nas artes gráficas em todo o mundo. Como já lhe disse anteriormente meus dois irmãos estudaram na Academia de Artes Gráficas da cidade de ??? até a Segunda Guerra Mundial foi a capital do setor.

12. Pode nos dar uma ideia da evolução do maquinário empregado na litografia no decorrer dos anos?
As máquinas iniciais, conhecidas como a máquina com a qual trabalhava Gutemberg, era a prensa, na qual punha-se a chapa. No caso de Gutemberg eram utilizados tipos e no caso da litografia utilizava-se pedra, devidamente preparada, onde se passava o rolo de tinta e o pano com água, à mão ... depois girava-se a prensa, de maneira a produzir pressão sobre o papel colocando sobre a placa, de modo que a tinta passasse da placa para o papel. Este foi o começo e pode-se dizer, num processo semi-mecanizado, com as tais das prensas que nós chamávamos de prensas de transporte. Somente em 1907 ou 1908, talvez um pouco antes, sobreveio a invenção, e grande aperfeiçoamento, com as chamadas máquinas litográficas rápidas. Estas eram movidas a motor e já não havia mais necessidade de se passar manualmente pano úmido nas pedras. A máquina correndo automaticamente, no vai e vem, passava pelo rolo de água e pelo rolo de tinta. Pelo processo de cilindro que corria sobre a pedra a folha era levada automaticamente, margeada ainda à mão, ocorria a impressão e a saída do material também era automática. Esta, pode-se dizer, foi a evolução de grande importância. Bem mais tarde desenvolveu-se nos Estados Unidos – foco de uma grande evolução - o sistema Offset que veio substituir com vantagens as máquinas rápidas. Era o inicio da impressão indireta. Este é ainda hoje o processo mais moderno que, entretanto, acredito que em 1910/1912 já tinha larga aceitação no mundo inteiro. Hoje, nós temos aqui, máquinas que imprimem quatro cores de uma só vez, que perfazem o espectro completo das cores numa só impressão.

13. Quais eram os concorrentes da Impressora Paranaense na fase litográfica e em que termos se processava esta concorrência?
Pelo que sei, a concorrência local era precisamente a firma de Schroeder e Rômulo César Alves e depois, mais tarde, creio que aproximadamente em 1920, a concorrência formada pelo senhor Schroeder deixou a Litografia Progresso onde atuava como litógrafo e se ligou ao senhor Kirstein, formando a segunda firma concorrente da Impressora. Algum tempo depois, com a interferência e associação da Firma Fontana, este estabelecimento transformou-se na Sociedade Metalgráfica.

14. Esta concorrência era muito difícil?
Neste tempo a concorrência era verdadeiramente ferrenha, tremenda. Acredito inclusive que houve situações de bastante ardor na luta pelos pedidos das empresas.

15. Quais eram os clientes da Impressora Paranaense então?
Um dos nossos principais fregueses era a Fábrica de Fósforos Pinheiro que era atendida desde 1912/1913, com um consumo mensal de milhares de etiquetas. Era um freguês bastante firme que nunca deixou de ser atendido pela Impressora Paranaense. Também atendemos a várias cervejarias que não existem mais como a Atlanctica, Cruzeiro e Providência. Havia já naquele tempo uma ligação entre a Impressora e a firma de Leal Santos, de Pelotas. Os últimos eram muito bons fregueses, a ponto de um senhor de lá ter sido nosso sócio até 1922 ou 1924. Houve, portanto, um longo período em que atendemos em grande escala pedidos desta empresa conhecida como produtora de conservas tanto de peixes como de frutas. Além disto, atendíamos todos os fregueses que consumiam envelopes timbrados, papéis-carta, feitos por um sistema profundamente artístico e de domínio difícil, que era a gravação em pedra. Esta gravação também era utilizada na confecção de apólices do Estado ou do Município, títulos de valores, cheques, etc. Havia uma máquina especial para este processo que gravava determinadas linhas. Porém, tudo que não obedecia a linhas tinha que ser gravado à mão, com determinadas agulhas, dentro da pedra, mais ou menos como se processo hoje a rotogravura. Esta gravação era feita numa pedra especial, que chamávamos de pedra litográfica azul, Era mais dura e menos porosa, que recebia a gravação, um trabalho altamente artístico.

16. Quem teria introduzido a gravação na Impressora Paranaense?
Vários litógrafos contratados da Alemanha, também da Suíça e Áustria faziam este trabalho. Entre eles eu me lembro perfeitamente do senhor Pohl que este na Impressora durante anos e mais tarde acabou se transferindo ao Rio de Janeiro onde abriu sua própria litografia. Ele trabalhou longo tempo conosco e dominava esta arte. Mas, o que mais intensamente trabalhou com gravação na Impressora foi o chefe de nosso litógrafos das últimas décadas, o senhor Alberto Thyle. Um homem de capacidade extraordinária que não só fazia a gravação em pedras como também elaborava croquis, dando ideias para rótulos e embalagens. Aliás, este trabalho de criar o rótulos era feito pela própria litografia. É o que hoje fazem as empresas de publicidade, que mantém seus desenhistas para fazer o que anteriormente nós tratávamos diretamente com o cliente. Hoje não, recebemos os trabalhos devidamente preparados pelas agências.

17. O primeiro desenhista precisava, então, ser um elemento bastante criativo?
Tinha que ser, por força das circunstâncias. Era um criador de arte, como são hoje os desenhistas de agências de publicidade.

18. Algumas pessoas colocam que o volume de trabalho de uma litografia estava sujeito a períodos cíclicos de muito movimento e outros de pouquíssimo movimento, como de concorrência da safra do mate. A Impressora Paranaense também sentia estes reflexos? Em que medida?
Sem dúvida nenhuma. Mas a indústria da erva mate até poucos anos atrás estava num florescimento extraordinário e o trabalho feito nas litografias era intenso, em quantidades apreciáveis, de rótulos para barricas e embalagens. Isto modificou bastante, porém, foi sendo apanhado um novo mercado, mais amplo. A Impressora mesmo ampliou sua área de influencia indo a outras cidades como Ponta Grossa, por exemplo, Rio Negro, Joinville e todo o Estado de Santa Catarina. Além disto, mesmo na época do mate haviam pedidos de muito trabalho nos últimos meses dos anos, devido ao hábito, generalizando de se distribuir folhinhas. Quase todas as firmas faziam as suas e o trabalho dentro de uma litografia era bastante intenso. Terminada esta entrega, naturalmente baixava o grau de utilização das máquinas.

19. Quais foram os fornecedores de papel da Impressora Paranaense no decorrer dos anos? Sofreram algum tipo de problema com este fornecimento? Quando o papel nacional começou a ser utilizado apresentava boa qualidade?
Eu não lembro o nome dos nossos fornecedores de papel no estrangeiro, só sei que havia no Brasil representantes de fábricas europeias e americanas que mantinham aqui seus depósitos, porém, poucas vezes utilizamos seus serviços. Normalmente o papel era importado sem quaisquer dificuldades. Havia um suprimento no mercado nacional por parte dos atacadistas, em ocasiões excepcionais. Mas foi por volta de 1917/1918 que se começou a produzir o papel nacional. O primeiro fabricante, pelo que me consta, foi a firma Klabin e Cia em São Paulo, que desde aquele época já fornecia papel próprio para a arte gráfica. Contudo, quando as fábricas de papel foram forçadas a consumir celulose e pasta mecânica nacional, começaram as grandes dificuldades. Porque o inicio o papel era fabricado aqui, porém com a matéria prima importada e dentro do mesmo sistema de fabricação do estrangeiro. Quando o Brasil, para poupar divisas começou a produzir celulose e pasta mecânica própria apareceram problemas, porque havia muita diferença entre o papel de uma remessa e o papel da remessa seguinte. Acontece que para a impressão e especialmente para a litografia o papel tem que apresentar uma certa estabilidade, uma certa uniformidade, tanto na sua superfície quanto na sua massa. Porque, imagine, trabalhar com um papel, no qual se imprimia a primeira cor, e quando se ia imprimir a segunda, ele havia crescido ... não ocorria a sobreposição perfeita entre as cores ... Se isto ainda ocorresse de forma uniforme, mas não. As dificuldades eram tantas que os prejuízos se manifestavam numa grande porcentagem de refugo.

20. Como eram contornados estes problemas?
Este problema foi praticamente contornado com um breve preparo do papel na nossa própria impressora, no sentido de adaptar sua massa ao clima do estabelecimento. Quando digo clima refiro-me a temperatura e principalmente ao grau de umidade relativa do ar. Esta tinha que obedecer a uma constante. Quanto se consegue isto o papel já não apresentava mais grandes diferenças. Depois, com o tempo, as fábricas nacionais forma melhorando a celulose e a pasta de madeira e esta dificuldade já não era mais tão importante. Mas este problema existe ainda hoje em menor escala.

21. Parece que havia também o problema de resíduos de areia que era “mortal” para o litografia ...
De fato, havia este problema dos resíduos de areia. Provinha do fato da opacidade do papel ser uma consequência da mistura do caulim dentro de sua massa. O caulim puro é perfeito, o caulim apropriado não contém areia, mas o caulim que se usava na fabricação do papel continha areia e estragava as chapas de impressão. Fazia riscos. Um grão de areia puxado sobre a pedra deixava um sulco profundo que por sua vez aceitava tinta e imprimia. Então, toda a sujeira aparecia. Era uma coisa tremenda, que a técnica só foi superando com o tempo. Depois, a fabricação do papel foi sendo feita com maior conhecimento de causa, evitando estes inconvenientes. Mas antigamente vinha uma remessa de papel, constatava-se a presença de areia e a encomenda volta a fábrica como devolução devido ao impossível aproveitamento.

22. Na fase inicial, quando tudo era importado, desde matéria prima ao maquinário havia auxílios do governo federal para estas importações?
Que eu saiba não. Talvez não tenha em minha memória exatamente algumas destas informações. Pelo que me lembro, no entanto, em todas as importações feitas quando eu ainda era adolescente, o meu pai sempre pagava os direitos alfandegários que contido eram mínimos. Não havia necessidade do governador oferecer facilidades. Os direitos aduaneiros eram mínimos.

23. Quando começou a operar a Impressora Paranaense viu-se obrigada a mandar buscar técnicos no estrangeiro?
Técnicos estrangeiros foram mandados buscar já no inicio da operação da litografia e ainda antes, quando só operava o setor de tipografia. Eu lembro que muita gente foi contratada para a tipografia há muitos anos atrás. Esta contratação, aliás durante muito tempo teve caráter regular. Havia, ainda, os aprendizes práticos. O nosso homem que se adapta facilmente a determinadas técnicas que ele absorve e depois prática. Mas não tem o fundamento teórico que é exatamente o da escola europeia ou norte-americana. Mas usou-se uma grande escala de contratação de técnicos estrangeiros para as gráficas nacionais.

24. A maioria dos técnicos estrangeiros era de origem alemã?
Eu cito, por exemplo, o senhor Francisco Folch, que era espanhol de nascimento, bom litógrafo que depois tornou-se proprietário e co-proprietário da Impressora Paranaense. Havia tanto espanhóis quanto italianos, estes que são bastante dedicados a arte, só que sua atuação pronunciou-se principalmente em São Paulo onde muitos estabelecimentos gráficos tinham origem italiana, dirigidos por técnicos italianos e bons técnicos. Portanto, não era exclusividade dos alemães, apesar de Leipzig ter sido o centro mundial da arte gráfica. Certamente os alemães deram maior porcentagem de litógrafos ao mundo, do que outros países. Mas, tanto os italianos como os suíços, franceses e espanhóis eram ótimos elementos técnicos.

 
25. Alguns depoimentos apontam o estado de Santa Catarina como o grande celeiro de litógrafos, esta afirmativa procede?
Procede. Havia várias empresas gráficas em Santa Catarina que realmente sabiam ensinar a profissão aos adolescentes, formando realmente litógrafos, todavia, sem o preparo técnico. Santa Catarina, portanto, tem o mérito, em certa escala, de desenvolver o pessoal. Tanto assim, que Joinville, minha cidade natal, tinha duas litografias, a do meu pai e outra da Boehn & Cia que existe ainda hoje. Além disto, havia em Blumenau a Empresa Gráfica Catarinense, não lembro o nome de seu fundador, mas que teve um grande litógrafo. Esta empresa mais tarde passou para outros nomes, mas tinha uma grande influencia entre os setores consumidores catarinenses e também de outros estados.

26. Os técnicos eram formados dentro da própria empresa? Como a Impressora contornava o problema de qualificação de pessoal?
Realmente a Impressora Paranaense formou técnicos em todos os setores de sua atividade e técnicos respeitáveis que chegaram e, ainda hoje, estão estabelecimentos gráficos em todo o Brasil. Acontece que o chefe da gráfica, o chefe do setor litográfico, automaticamente era uma espécie de professor e tinha sempre ao seu dispor três ou quatro aprendizes para os quais transmitia informações. Quando um destes aprendizes tornava-se adulto e dominava o conhecimento, saía para tentar a vida em outros estabelecimentos, em outros cidades ou estados. Muitos, no entanto, ficaram aqui quarenta ou cinquenta anos, até o final das suas vidas.

 
27. De que forma se processa este aprendizado?
Os aprendizes começavam com o fundamento da perspectiva. Depois o desenho de tipos, que era uma das artes mais difíceis, esta de desenhar tipos perfeitos. Exigiam mão muito firme. Bom de passo em passo eles iam avançando na técnica até chegarem a fazer sua própria experiência num desenho, em uma chapa ou então na pedra. Mas antes disto, passava-se anos até que fossem considerados elementos produtivos. Eram considerados aprendizes, nos seis meses iniciais não ganhavam nada e depois passavam a receber um salário bastante reduzido, até que fossem considerados realmente formados como técnicos o que geralmente se processava em cerca de 3 a 4 anos. Este período naturalmente dependia da inteligência, sensibilidade do individuo em absorver os conhecimentos.

28. Havia alguma prévia para o candidato a aprendiz?
Sim, pelo menos o primário completo.

29. E no sentido de que apresentasse alguma habilidade, um talento para o desenho?
Dependia exatamente da capacidade do chefe da litografia, de procurar e se concentrar naqueles que tivessem esta facilidade, este dom, próprio do litógrafo. Muitos aprendizes começavam e desistiam porque não se justificava seu aperfeiçoamento, dado que lhe faltava gênio, o dom.

 
30. Pode citar todos ou pelos menos a maioria dos litógrafos que passaram pela Impressora caracterizando seu trabalho?
É muito difícil, porque nós tínhamos muitos, normalmente entre oito a dez litógrafos. Já citei um dos mais antigos, o senhor Harmim Hanquel, que hoje é falecido. Ele foi chefe da nossa oficina, foi grande gravador e ao mesmo tempo, um esplêndido professor aos seus aprendizes. Tivemos também o senhor Pohl que se tornou depois proprietário de uma litografia no estado do Rio de Janeiro. Também Guilherme Traple, que era um artista exímio e, além disto, fazia pinturas à óleo, que devem ser lembradas ainda hoje. Ele foi discípulo de Andersen. Depois tivemos também o senhor Paulo Horbchan, que aprendeu aqui conosco. E não se pode esquecer o senhor Schroeder que foi também um grande litógrafo, mas não no meu tempo.

31. E sobre o senhor Arnaldo Raschendorfer, cujos rótulos estamos expondo?
Não me lembro bem de suas especialidades, mas sei que era muito bom desenhista. Havia, também, o Alberto Thyle que trabalhou conosco durante 50 anos. Do Raschendorfer só lembro que trabalhou muito tempo conosco. Havia também o meu irmão Max Schrappe que era litógrafo e aprendeu sob a batura do Hanquel e do Thyle. Paulo Ramos também era litógrafo. Este, por sinal, veio trabalhar conosco durante anos, depois foi a Blumenau, onde ocupou o cargo de chefe da filial da Impressora Paranaense. De outros não me lembro.

32. E a respeito de mulheres litógrafas. A única referência que encontramos nos arquivos da Impressora diz respeito a senhorita Hedwing Krause, lembra de outros nomes?
Há, é verdade. Tivemos duas. Além da senhorita Krause, que você mencionou, tivemos também a senhor Brigite, que aprendeu aqui conosco, tornou-se uma desenhista bastante hábil e saiu daqui para trabalhar em outros estabelecimentos de Curitiba, inclusive em um, cujo nome não me recordo, de propriedade de um suíço. Outras presenças femininas no cargo de litógrafo não houve aqui na Impressora. Também não lembro de ter ouvido falar de mulheres litógrafas em outros estabelecimentos.

33. Havia alguma restrição neste sentido?
Não. Desde que a mulher tivesse pretensão ao cargo e apresentasse o dom necessário aceitaríamos sem nenhuma restrição.

34. A maioria das mulheres que trabalharam na fase litográfica foram registradas na Impressora Paranaense na função de “serventes”. Pode explicar que função era esta?
Bom, elas não trabalhavam propriamente na seção litográfica, mas sim no departamento que nós chamávamos de conclusão. Conclusão de trabalho. Ali funcionavam um grande número de moças, aliás, principalmente moças. Algumas também trabalhavam nas máquinas litográficas mas restringiam sua atuação executando o margeamento das folhas que seriam impressas.

35. A que categoria profissional cabia o maior salário dentro da litografia?
Evidentemente o maior salário cabia ao litógrafo gravador, que tinha mais mérito que os demais litógrafos. Eram três categorias: litógrafo letrista, que só desenhava letras e era considerado o de menor categoria; depois havia o litógrafo cromista que desenhava em geral dominava também as demais categorias, enquanto os outros tinham especialização especifica. Além disto, o trabalho do gravador era essencialmente artístico, como já expliquei anteriormente.

36. Era frequente a Impressora Paranaense formar seus aprendizes e depois “perde-los” para outras litografias?
Bastante frequente. Durante uns cinquenta anos que estou aqui na Impressora centenas de aprendizes passaram por esta casa, atingiram o grau de profissional e depois a abandonavam. O principal motivo era simples e não dizia a respeito de salários. Porque aqui estes elementos sempre seriam encarados como aprendizes ou ex-aprendizes. Não galgavam facilmente a evolução da profissão.

 
37. Pode citar alguns casos?
Ih ... aí há dezenas e mesmo centenas de casos. Em todos os setores, não só na litografia, como também no preparo da pedra, tipografia, etc ... havia sempre elementos que se preparavam sistematicamente e depois saiam. Muitos, inclusive se estabelecendo por conta própria.

38. O senhor Schnneck teria sido um destes casos?
Não, ele já chegou a Impressora devidamente formado como profissional, aliás, um bom profissional.

39. Seria então o caso de Rômulo César Alves?
Isso mesmo. Rômulo César Alves aprendeu aqui. Introduziu-se na técnica de transporte, com um de nossos mestres. Um destes mestres veio com meu pai de Joinville no ano de 1912. Um bruto homem, grande profissional que ensinou muita gente. Havia também o Werner (?????) que aprendeu aqui e depois transferiu-se para outros estabelecimentos. Entre litógrafos ocorreram realmente muitos casos mas os nomes não me ocorrem efetivamente. Havia um, inclusive de uma família muito conhecida em Curitiba, e que aparece em nossas fotografias. Mas enfim, em todos os setores, em todos os tempos, tivemos verdadeiros mestres, bons oficiais e vários aprendizes.

40. Na fase litográfica, que profissional criava o rótulo ou anúncio, quem dava a ideia?
A ideia fundamental era dada pelo primeiro desenhista ou chefe da seção litográfica e os outros, com maior ou menor dom para o desenho executavam. Quem nos fez milhares e milhares de rótulos foi o senhor Alberto Thyle. Antes dele o senhor Phol. Que também foi chefe da seção litográfica e ainda mais anteriormente o senhor Schroeder, só da presença deste último eu não recordo, só sei o que me contaram. De qualquer forma, o homem da arte final, nosso principal foi mesmo o senhor Thyle que trabalhou conosco mais de 40 anos.
Nosso trabalho tenta se aprofundar em torno da dupla Schroeder e Kirstein. Como o primeiro trabalhou algum tempo na Impressora Paranaense passamos a perguntar:

41. Lembra do senhor Schroeder como pessoa? Chegou a saber porque ele veio ao Brasil? Sabe algum detalhe sobre o seu aprendizado como litógrafo na Alemanha?
Detalhe eu não posso dar nenhum. Só sei que o senhor Schroeder trabalhou na Impressora Paranaense de onde saiu no ano de 1912 para formar uma nova firma, Schroeder & Alves, mais tarde denominada Litografia Progresso. Nesta época eu não o conhecia. Só o encontrei mais tarde, pois ele morava na esquina da Comendador Araújo. Era casado com uma senhora da família Chella. Encontrava muito com ele mas não lembro de detalhes de sua pessoa. Sei porém, que um homem bastante preparado, um grande profissional. Sei também que constituiu mais tarde a firma Schroeder & Kirstein e, se não me engano muito, constituíram, mais tarde, fazendo parte da Sociedade Metalgráfica que faziam latarias e decalcomanias, aliás as primeiras fabricadas no Paraná e no Brasil.

42. Lembra do senhor Schroeder como profissional? Que avaliação faria do seu trabalho?
Certamente foi um profissional de excelente conceito. Não cheguei a conhecer seu trabalho, mas pelo fato de ter sido sócio do senhor Alves e depois do senhor Kirstein, ambos bons profissionais, só posso imaginar grandes qualidades em seus trabalhos.

43. Alguns depoimentos colocam que Schroeder foi um dos grandes inovadores em litografia em sua época. O senhor concorda?
Concordo. Ele e o Kirstein foram inovadores, pois pelo que me lembro, coube ao primeiro elaborar a primeira decalcomania no Brasil. A partir daí, pode-se imaginar que tenha sido bastante inovador.

44. Lembra qual era a função do Schroeder dentro da seção litográfica da Impressora?
Não. Este detalhe não me ocorre.

45. Segundo o senhor Leonardo Born, bem no inicio, só o senhor Schroeder e outro funcionário da Impressora Paranaense dominavam a técnica de gravar em pedra. O senhor concorda? Pode citar o nome deste funcionário?
Não concordo. Acredito que o senhor Schroeder tivesse tido esta competência, mas tínhamos aqui na Impressora Paranaense o senhor Pohl, que foi chefe de oficina durante longos anos e que depois estabeleceu-se por conta própria com uma litografia. Pois ele dominava perfeitamente a técnica de gravação. Tivemos, também, o senhor Thyle que dominava perfeitamente esta arte. Como vê, aí já são três, mas lembro que havia um quarto cujo nome não me recordo ...

46. Numa de nossas conversas o senhor citou o nome de seu irmão Max...
Ele gravava, realmente, mas não em grande escala. Aprendeu com o Pohl, só que não dedicou-se ao setor. Também não acredito que tivesse habilidade tão grande de seu mestre.

47. Qual era o nome da litografia do senhor Henquel?
Litografia Harmin Henquel

48. Esta litografia durou muitos anos?
Não, bem poucos, porque depois o senhor Henquel passou a dedicar-se a fotografia. Preparava filmes, revelava, para o público em geral. Eu mesmo fui seu cliente bastante assíduo quando me dedicava a fotografia. O senhor Henquel fazia inclusive fotografias artísticas e postais de Curitiba. Harmin Henquel, agora me lembro, foi meu padrinho de batismo

49.  Ainda segundo depoimentos, o senhor Schroeder conheceu Rômulo César Alves na Impressora Paranaense e de lá os dois saíram para abrir a sociedade que resultou na criação da firma Schroeder e Alves que, mais tarde, denominou-se Litografia Progresso, o que o senhor sabe a respeito?
Olhe, eu confirmo plenamente a primeira parte. Pelo que me lembro, inclusive, a fusão do senhor Francisco Folch, então proprietário da Impressora Paranaense, com o meu par teria vindo a contra gosto principalmente de Rômulo César Alves que pensava ele mesmo assumir a direção do estabelecimento, e quando meu pai assumiu, ele então resolveu estabelecer-se por conta própria.


50. Mais tarde, ao deixar Litografia Progresso), Schroeder abriu estabelecimento próprio na antiga Rua Assunguy, o senhor chegou a conhecer este estabelecimento? O que sabe sobre sua produção?
Não cheguei a conhecer esta Firma, mas ouvi falar a respeito. Mais tarde tanto Schroeder quanto Kirstein foram trabalhar na frente do Passeio Público, na rua João Gualberto, onde funcionava a Sociedade Metalgráfica. 

51.  A introdução da decalcomania no Paraná e no Brasil tem sido atribuída a Schroeder e Kirstein, o senhor concorda? O que sabe a respeito?
Concordo e admiro os dois por esta realização bastante útil a coletividade, pois, com as decalcomanias abriu-se um mercado interno em todo o Brasil. Eles têm um mérito bastante grande e, inclusive, começaram a fabricação deste produto em sua oficina na Rua Assunguy, antes de entrarem na Sociedade Metalgráfica. 

52.  O que o senhor sabe da participação de Schroeder e Kirstein na criação da Sociedade Metalgráfica?
Não conheço detalhes. Só sei que eles foram financiados por Francisco Fido Fontana que queria latas para embalar o seu mate e especialmente o seu chá. O Fontana chegou a trocar idéias com meu pai a este respeito, mas sei lá por quais circunstâncias, acabou se associando a Schroeder e Kirstein. Começaram a confeccionar latas impressas, idéia bastante avançada para a época. Portanto, Schroeder e Kirstein tiveram mérito não só de introduzir a decalcomania como também iniciar no estado a impressão em folhas de flandres, latas impressas. 

53.  Durante quanto tempo o senhor Schroeder trabalhou na Impressora Paranaense?
Este detalhe também me escapa totalmente.

54.  A Impressora Paranaense enfrentou muitos problemas por ocasião das duas guerras e especialmente por ocasião da segunda?
Durante a primeira guerra tivemos uma luta bastante dura, árdua mesmo, porque houve uma verdadeira crise. Mas os problemas foram contornados. Em relação á segunda guerra tivemos problemas maiores.

55. Parece que o prédio chegou a ser destruído por ação popular, não foi?
Houve, como tive oportunidade de dizer, na noite de 18 para 19 de março um sério problema, quando um  grupo, que chamaram de povo, mas que no meu entender era de desordeiros que levados por algumas pessoas que os guiaram para cá, depredaram a Impressora Paranaense, causando-nos um prejuízo imenso. Mas, assim mesmo, depois de algumas semanas retornamos totalmente ao trabalho.

56.  Quer dizer que as atividades chegaram a ser paralisadas em função do quebra-quebra?
Sim, chegou a paralisar. Naquela época, já tínhamos mais de 300 funcionários que ficaram, temporariamente sem o pão de cada dia. As autoridades, contudo, nos ajudaram a reconstruir o prédio para que voltássemos a operar o mais breve possível. 

57.  Qual foi o primeiro endereço da Impressora Paranaense?
O estabelecimento começou a operar em seu primeiro prédio, na Rua Riachuelo, esquina com a rua Carlos Cavalcanti. Ainda temos a foto deste prédio. De lá, bem mais tarde, foi transferida para o endereço atual, na rua Comendador Araújo, números 107 e 109. Um número era da entrada da fábrica e o outro era da residência que havia na frente, onde nós morávamos. Meu pai, mamãe e 8 filhos. O prédio atual foi construído exatamente durante a guerra, do ano de 1941 a 1944. 

58. Parece que parte da fábrica da Impressora foi transferido para a BR 116, é verdade?
A transferência já foi iniciada e a metade das máquinas mais novas já estão operando na BR116. Esta transferência, que começou há um ano, logo estará processada totalmente. 

59. A Impressora Paranaense mantém um museu?
Nós mantemos aí uma porção de cópias de contratos, fotografias, mas não temos um museu.

60. Existe algum plano no sentido de preservar documentação e p material produzido?
Existe, sempre existiu, Sempre desejávamos tratar deste assunto com mais carinho mas nada foi realizado ate hoje. Em todo o caso preservamos alguns livros impressos aqui, algumas pedras litográficas e alguns catálogos produzidos mais recentemente. O material mais velho e que apresentaria maior interesse para este trabalho, não foi preservado infelizmente devido às ocorrências da noite de 18 de março. Havia na frente da firma, naquela noite, uma pilha de 40 a 50 cm de altura de papel que foi queimado. 

61. A Impressora dispõem de uns poucos textos sobre sua história e fundação. Por quem eles foram elaborados?
Acredito que um deles tenha sido elaborado em parte por mim e em parte por jornalistas que ouviram minhas informações. Um destes históricos foi escrito pelo jornalista Walcimar. Outro foi elaborado em 1948. 

62. A Impressora enfrentou muitas questões trabalhistas?
Não, mas houve uma greve, não lembro bem das circunstâncias. Sei que havia em São Paulo uma Associação dos Empregados Gráficos, que reunia pessoal alemão, entre técnicos, litógrafos, transportadores, tipógrafos, enfim, todo o pessoal empregado no setor. O que hoje chamamos de sindicato. Só que não havia legislação nenhuma, então faziam o que queriam; e impuseram ao meu pai que reempregasse um litógrafo que fora recentemente demitido. Os nossos empregados se uniram, fizeram greve geral até que meu pai colocasse novamente o litógrafo despedido. Tudo ocorreu em alemão, as queixas, o contrato. 

63. Esta Associação tinha filial em Curitiba?
A Associação era em São Paulo e chamava a si o direito de interferir. Fez inclusive um contrato com meu pai, em alemão, no qual ele se obrigava a pagar 250 mil réis por mês ao litógrafo. Um salário mínimo profissional. época. Isto era uma fortuna para a época.

 
64. E este salário foi cumprido?
Não, Porque havia uma cláusula que liberava os profissionais já empregados. Quer dizer, os mais antigos não precisavam receber o novo salário. 

65. Esta Associação era plenamente reconhecida?
Certamente não. Naquele tempo não havia regulamentação, havia muito mais liberdade. 

66. E o funcionário acabou sendo reconduzido ao cargo?
Isto não consta nos autos, portanto não posso afirmar, mas acredito que sim. O que sei é que papai precisou chamar a polícia que tomou conta do estabelecimento. Guardou noite e dia para que não houvesse distúrbio.

67. Quer dizer então que ninguém furou o cerco, todo mundo aderiu a greve...
Todos empregados aderiram. 

68. Então a Associação tinha bastante força diante dos empregados.
Certamente.

69. Houve outras questões trabalhistas?
Nunca tivemos questões trabalhistas desta categoria de greves. Nem no tempo do João Goulart. Nenhum distúrbio.
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70. Algum rótulo ou cartaz chegou a sofrer algum tipo de censura?
Não me recordo.

71. Em seu depoimento o senhor Stuzz, funcionário da Impressora, afirma que sim, e cita o caso de um cartaz para uma cervejaria no qual aprecia uma mulher de maiô e que foi proibido.
Não lembro deste caso. Recordo, isto sim, de um cartaz onde aparecia uma moça coberta somente por uma leve estola(?). Não era nada indecente, ao contrário, bastante artístico. Se este causou alguma celeuma não tenho notícia.

72. Na sua opinião porque desapareceram as litografias que faziam concorrência à Impressora em outros tempos?
Desapareceu a litografia Harmin Henquel, Hoffmann, Sociedade Metalgráfica, o Alves Schroeder e Kirstein porque não acompanhavam as novas técnicas. Não aderiram a tecnologia moderna que se impunha. Não evoluíram.

73. O senhor já contou no início a origem da Impressora Paranaense, desde a sua fundação, fase em que sua família não participou. Para finalizar queria que contasse a origem dos negócios de sua família até que chegassem à Impressora Paranaense.
Meu pai chegou ao Brasil no ano de 1891. Encontrou um senhor, cujo nome não lembro que foi a primeira pessoa que ele encontrou falando o alemão. Fizeram amizade. Conheceram-se em São Bento, cidade para qual meu pai dirigiu-se à pedido de sua mãe que tinha parentes distantes. De São Bento, acompanhou um grupo de caboclos com os quais viveu para aprender o português. Trabalhou mais tarde como guarda livros do pessoal ligado ao mate. Mais tarde transferiu-se para Curitiba onde esteve empregado na velha firma de José Hauer, na função de guarda livros. Voltou à Joinville onde estabeleceu-se com um negócio de importação onde vendia faqueiros, louças e coisas domésticas. Tudo ocorria muito bem até que o amigo dele, aquele que citei no início o convidou para acompanhá-lo a Papanduva. Nesta época meu pai tinha recebido uma herança em virtude do falecimento de sua mãe. Voltou então à Alemanha, onde casou-se e, de posse da herança, estabeleceu-se em Papanduva com uma litografia. A finalidade principal era a de fabricar baralhos. Aliás, ainda temos uma amostra. 

74. Qual era o nome desta litografia?
Eu acredito que tivesse sido Litografia Max Schroeder contudo não posso afirmar. Só sei que na filial que abriu bem mais tarde em Curitiba, no Recreio Cruzeiro, denominou de M. Schrappe e Cia. Bem, mas voltando a história.., estabelecido em Papanduva, papai teve muita dificuldade porque o material para a confecção dos baralhos, o cartão, não era lá de qualidade muito boa e faltava um conhecimento técnico mais profundo sobre o assunto. Fracassaram, portanto, e resolveram fabricar rótulos e embalagem para aproveitar as máquinas que já havia adquirido. Um belo dia ele saiu de Papanduva e foi a Joinville onde com a ajuda de amigos, conseguiu importar uma máquina de impressão rápida e ali começou, então o desenvolvimento geral.

75. De Joinville ele veio à Curitiba é isto? Em que ano?
Bem, ele tinha fregueses em Curitiba. Por esta época os ervateiros eram quase todos atendidos Por ele. este atendimento sofreu uma interrupção brusca por volta de 1908-1909 por ocasião da Guerra do Contestado, entre Paraná e Santa Catarina e não permitia qualquer mercadoria viesse de lá para cá e vice-versa. Com isto meu pai viu-se impossibilitado de atender sua freguesia curitibana e resolveu, então, abrir aqui urna filial. Trabalhou no Batel até 1912 quando então fez a fusão com a Impressora Paranaense e de lá para cá a história já foi contada. 

76. Quer dizer, então, que a questão do Contestado é que motivou a criação da filial?
É. Realmente houve a guerra entre os dois Estados, devido à questão dos territórios divididos pelo Governo Federal na qual o Paraná sentiu-se prejudicado. Aliás, os professores costumavam nos dizer, na escola aqui em Curitiba, que os políticos paranaenses não tinham sido ativos e não tinham trabalhado pela causa enquanto os catarinenses tinham mostrando-se bastante alertas, muito presentes na questão. 

77. Seu pai teve quantos filhos?
Papai teve nove filhos, aliás, minha mãe... o mais velho faleceu ainda em tenra idade e ficaram então oito, sendo quatro homens e quatro mulheres.

78. Todos trabalharam na Impressora Paranaense?
Todos os quatro homens, sem exceção. 

79. E as mulheres?
Não, elas nunca trabalharam. Não era uso que elas o fizessem. Elas se preparavam para o casamento. Esta era a interpretação da época, nunca se cogitou que uma de minhas irmãs trabalhasse. Talvez tenham trabalhado um dia ou outro, numa emergência.

80. E atualmente, quantas pessoas da família trabalham na Impressora Paranaense?
Devem ser umas 12 pessoas, entre os velhos, que somos apenas dois, meu irmão e eu e os maridos de duas irmãs também. Os filhos de meus irmãos quase todos trabalham aqui. O meu filho mais velho, Max, é diretor da firma em São Paulo, o marido da minha filha, Clovis Borges trabalha aqui e também o meu filho mais moço, Werner Egon que já esta trabalhando à 10 anos.